sábado, 1 de janeiro de 2011

Para que serve a crítica de teatro?


31 dezembro 2010 Comentário

Artigo de Michel Fernandes, especial para o jornal Diário de São Paulo

saiu na edição impressa de 28 de dezembro de 2010

A importância de reconhecer a responsabilidade ao se escrever artigos sobre peças teatrais e se entregar à dúvida e ao questionamento


Dois dos principais objetivos de uma crítica teatral são propagar a reflexão sobre um espetáculo de teatro e mapear o momento histórico pelo qual passa o teatro, independente de julgamentos, em busca única da descrição da cena contemporânea ao crítico.

Em artigo de Sábato Magaldi lemos que a crítica comete muitos erros de avaliação, mas são equívocos necessários para propagar a reflexão acerca dos novos fenômenos teatrais, ponto que vai de acordo com as ideias da dramaturga Marici Salomão, de que a crítica é uma das bases da percepção, discussão e difusão de novos caminhos das artes cênicas.
Não quero com esse texto glorificar a atividade de crítico teatral, seria no mínimo pedante e pretensioso, mas, antes, reconhecer a responsabilidade que carregamos ao assinar nossos artigos e, por isso mesmo, nos entregarmos à dúvida, ao questionamento constante. Em lugar do autoritário “isso pode” e “isso não pode”, reconhecer que o teatro é território livre, em que quaisquer experimentações são possíveis e que, concordando ou discordando do fenômeno teatral que se critica, é necessário o embasamento teórico e de Sábato Magaldi, crítico e pesquisador de teatro experiências, vividas ou apreendidas em leituras, para se tecer o texto que, aliás, nada deseja ser definitivo, mas, tão-somente, uma alavanca para a discussão sobre tal fenômeno, já que segundo diz o diretor inglês Peter Brook “o verdadeiro bom teatro só tem inicio ao cair do pano”. É preciso refletir, sobretudo, “o que é?” e “para quem é dirigida?” a crítica teatral. É preciso diferenciar a crítica teatral dos materiais de divulgação de um espetáculo.

PRIMEIROS PASSOS PARA UMA BOA CRÍTICA
Ninguém duvida que a primeira característica exigida a autores de quaisquer editorias dos jornais e revistas, impressos (as) e eletrônicos (as), é que se escreva com clareza. Essa exigência tão importante ao repórter, cuja função é desembaraçar os fatos do cotidiano para seu público leitor, é apontada por Sábato Magaldi em artigo como condição primordial para que um texto crítico obtenha seu objetivo primeiro que é estabelecer a comunicação entre quem escreve e quem lê. Ele acrescenta que o crítico “julgue com extrema honestidade e sem preconceitos de gênero”. Magaldi diz também que “a primeira função da crítica é detectar a proposta do espetáculo, esclarecendo-a, se preciso, pelo veículo da comunicação. Em seguida, cabe-lhe julgar a qualidade da oferta e de as transmissão ao público”.
Para realizar o que chama de “julgamento” ele evidencia a necessidade do crítico assegurar seu conhecimento sobre o objeto do que vai propor a reflexão crítica – o espetáculo teatral. E, para a aquisição de tal saber, cabe ao crítico, além de sólida formação em cultura geral, a freqüente leitura sobre a estética teatral, seus diversos estágios diante da história teatral, estudos sobre os mestres – como Artaud, Meierhold, Craig, Bob Wilson, Stanislavski, Brecht, Piscator, entre tantos outros –, conhecimentos sobre a dramaturgia de Sófocles a Shakespeare, de Brecht a Dea Loher, de Padre Anchieta a Nelson Rodrigues, de Maria Adelaide Amaral a Juca de Oliveira, do texto coletivo ao processo colaborativo, enfim ser crítico é não ter medo de estudar e reconhecer que o saber jamais se esgota.